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Reflexão sobre a questão social encerra III SIPEC
Brasília, 21/10/2005 A questão social foi o tema de encerramento do III Encontro Nacional de Dirigentes de Recursos Humanos do SIPEC, com abordagens feitas em duas mesas redondas pelo professor Márcio Pochmann, do Instituto de Economia da Unicamp, e por Valmor Shiochet, diretor da Secretaria Nacional de Economia Solidária do Ministério do Trabalho e Emprego.
Mesmo utilizando caminhos diversos em suas palestras, ambos concordaram que o País nas últimas décadas, avançou mais na questão econômica do que na social, em função de três fatores básicos: falta de uma cultura democrática; falta de tradição; e padrões deficientes de políticas públicas.
Para Pochmann, houve uma descentralização dos recursos e das responsabilidades, principalmente a partir do Plano Real. "Houve, paralelamente, um aumento da carga tributária e uma redução do papel do Estado em termos de investimentos: de 4% a 6% nas décadas de 60 e 70 para algo em torno de 0,7% hoje", citou.
Essa situação, segundo ele, se deveu principalmente à falta de participação popular nas decisões de governo, pelo fato de o Brasil não ter uma cultura democrática. "Somos um País com 500 anos de existência e menos de 50 de democracia. O período atual é o mais longo de democracia continuada que experimentamos", enfatizou.
O segundo fator mais importante, para o professor Pochmann, é que o País não tem a tradição de uma revolução burguesa, como experimentaram Suíça e França; nem socialista, como China, Cuba, Rússia. Tampouco passamos pelas experiências que os países desenvolvidos capitalistas tiveram e que levaram a reformas profundas em décadas passadas. "Estamos falando de reformas clássicas, como a agrária e a tributária", enumerou. "Temos uma estrutura em que quem paga impostos são os mais pobres. Em conseqüência, não temos uma reforma social, onde haja habitação, saúde, transportes com qualidade para todos".
No entendimento do palestrante, sem essas reformas não se chega a um novo padrão de políticas públicas. Para ele, o desafio hoje não é mais de enfrentar questões como a fome e o analfabetismo, que predominaram no Brasil do início do Século XX até a década de 80. Para eliminar isso, bastava a ação setorial de um ministério. Ele considera esses problemas relativamente fáceis de ser solucionados, mas, ainda assim, o País ingressou no novo século ainda trazendo esses problemas na sociedade.
Mas no momento, a exigência é que se busque soluções para uma nova estrutura social, onde as questões cruciais são o desemprego - especialmente com o jovem que está ingressando no mercado, pois de cada dois desempregados um tem menos de 25 anos de idade -; a violência; as desigualdades de renda.
"Esses são problemas que não se alteram pela intervenção setorializada, pela ação isolada de um ministério ou secretaria, pressupõe uma série de ações articuladas", destacou Pochmann. "Se quisermos ser um país com padrão social digno precisamos, antes de mais nada de saber quanto custa isso. E não há esses recursos.
O professor citou, entre outros exemplos, a questão educacional no Brasil e comparou-a com a do Chile. De acordo com os dados apresentados, só 35% dos jovens de 15 a 17 anos estão matriculados no Ensino Médio brasileiro. O Chile tem 85% dos seus jovens nessa faixa etária cursando o Ensino Médio. "Portanto, se quisermos ser um Chile, temos de incluir 4,9 milhões de jovens. Isso representa 140 mil turmas e exige a contratação de 510 mil professores", enfatizou. "E o quadro é mais grave ainda no Ensino Superior, onde temos apenas 8% dos jovens matriculados".
O secretário Nacional de Economia Solidária do Ministério do Trabalho e Emprego, Valmor Shiochet, concorda com a tese exposta pelo professor da Unicamp, e acrescenta mais um pressuposto: a experiência histórica brasileira mostra que nós associamos o conceito de democracia com a idéia do fortalecimento da sociedade civil.
Isso ficou expresso principalmente na década de 70, período em que se fortaleceu a sociedade para enfrentar a ditadura, o Estado. Essa foi, para ele, a idéia que marcou o processo social brasileiro nos últimos 30 anos. A democracia é, portanto, resultado de uma sociedade politicamente organizada. Ele espera que, de forma crescente, a população brasileira "faça construir dessa tragédia humana que é a exclusão, a falta de terra, de tetos, de educação um instrumento de criação de laços sociais".